domingo, 7 de abril de 2024

“Os livros nos tornam mais humanos” (Michel Desmurget)

Artigo compartilhado do BLOG DO ORLANDO TAMBOSI, de 5 de abril de 2024

“Os livros nos tornam mais humanos”, diz o neurocientista Michel Desmurget.

Um dos maiores críticos da dependência de telas e meios eletrônicos na atualidade tem um antídoto para preservar a inteligência e a saúde mental: ler mais. Entrevista a Diogo Sponchiado, da Veja:

Primeiro, o diagnóstico, depois, o tratamento. Sob essa lógica, o pesquisador francês Michel Desmurget descortina as raízes da queda no desempenho intelectual e o aumento de problemas emocionais entre os mais jovens. Seu exame, baseado em evidências científicas, deu origem ao best-seller internacional cujo título entrega, sem medir palavras, a visão do autor: A Fábrica de Cretinos Digitais. Agora, o neurocientista, que está à frente do Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica da França, oferece o remédio para evitar ou reverter os males causados pela onipresença e dependência de telas, games, redes sociais e companhia: a leitura. Em Faça-os Ler!, publicado pela editora Vestígio, ele reúne uma avalanche de estudos para mostrar que esse hábito — sobretudo quando cultivado por prazer, fora das obrigações escolares — tem sido corroído pela vida virtual, numa troca que faz crianças e adolescentes perderem as vantagens únicas oferecidas por livros e revistas. Em entrevista a VEJA, Desmurget elucida os benefícios mentais e sociais capazes de influenciar os rumos da humanidade.

Em seu novo livro, o senhor denuncia uma redução gradual e perigosa nos níveis de leitura em escala global. Os meios eletrônicos são os culpados? Com certeza. Numerosos estudos confirmam que nos últimos cinquenta anos o tempo de leitura diminuiu drasticamente, e isso está relacionado ao aumento no tempo dedicado às telas. As horas que nossos filhos destinam ao entretenimento digital têm de ser roubadas de algum lugar, de modo que as telas consomem hoje quase todo o período antes reservado à leitura. E, como esperado, à medida que os mais novos leem menos, cai também sua proficiência na leitura. No último meio século, a maioria dos países ocidentais registrou um declínio nas competências linguísticas e no desempenho de leitura entre os jovens.

Mas eles também leem no celular ou no computador, não? As pessoas dizem que as crianças gostam de ler. Só que, no fim das contas, elas não estão lendo. Preferem jogar videogame ou assistir a séries ou desenhos animados. Também nos dizem que nunca leram tanto desde o advento da internet, mas isso não é verdade. O tempo de tela dedicado à leitura não excede 2% a 3% do período total dedicado aos meios eletrônicos, dependendo da idade. Fora que o conteúdo é pobre demais do ponto de vista linguístico para oferecer um efeito benéfico. A maioria dos estudos mostra que o tempo gasto em blogs e redes sociais impacta negativamente as habilidades com o idioma e o desempenho acadêmico.

Desde a publicação de A Fábrica de Cretinos Digitais, em 2019, acredita que a sociedade está mais consciente dos riscos de tanta tela? Sim, uma consciência coletiva está emergindo. A situação atual reflete a trajetória de questões de saúde pública anteriores, como o tabagismo, o uso de pesticidas e o aquecimento global. Inicialmente, há negação. Depois, uma espécie de minimização para retardar a sensibilização da sociedade. Contudo, os fatos não podem ser escondidos sob o verniz do marketing e do lobby. Chegamos a esse ponto em relação às telas. A evidência ultrapassou o domínio das investigações científicas e permeia as observações cotidianas. O excesso de telas está por trás de uma proliferação de problemas relacionados a linguagem, atenção, memória e impulsividade, levando a um declínio na capacidade intelectual de nossos filhos. Os últimos estudos do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) reforçam essa preocupação. Surpreendentemente, as empresas responsáveis pelas redes sociais continuam escalando seus esforços de lobby. A Meta, que controla Facebook e Instagram, nos serve como um ótimo exemplo. Documentos internos recentemente expostos revelam que a companhia sabia dos efeitos nocivos de seus produtos. E 41 estados americanos estão levando o caso aos tribunais sob a acusação de que eles causam “danos significativos à saúde física e mental”.

Se continuarmos a perder leitores nesse ritmo, como vislumbra o futuro da humanidade? É claro que podemos viver e encontrar a felicidade sem ler. No entanto, uma vez que se aceita esse princípio, surge a questão: o que perdemos quando não lemos? A resposta é simples: perdemos uma parte essencial daquilo que nos torna humanos. Não é por acaso que os livros e a linguagem têm sido consistentemente alvos das ditaduras mais implacáveis. Os nazistas queimaram mais de 100 milhões de livros e, como bem demonstra o acadêmico Victor Klemperer, embarcaram em um processo de empobrecimento linguístico semelhante ao descrito por George Orwell em seu romance 1984. Em Minha Luta, Hitler retrata a literatura como um veneno para as pessoas. A melhor ilustração de como seria um mundo sem leitura é, a meu ver, fornecida por Aldous Hux­ley em Admirável Mundo Novo. Nele, o autor descreve uma massa voluntária de técnicos devotados, moldados para atender às necessidades econômicas, alimentados à força por entretenimento estúpido e contentes com a servidão que mal podem perceber. Em contraste a eles, Huxley descreve uma pequena elite equipada com as ferramentas linguísticas e culturais necessárias ao pensamento. Encontramos a mesma ideia no romance Fahrenheit 451, de Ray Brad­bu­ry. De um lado, está o bombeiro Montag, cansado de queimar livros, refletindo sobre o mundo e a sociedade. Do outro, sua esposa Mildred, viciada em TV e em drogas psicotrópicas. Ler é o antídoto para Mildred. É o caminho para a emancipação.

Por que o senhor defende de forma veemente a necessidade de estimularmos o hábito de ler em família desde cedo? A leitura não é inata para o ser humano. É um legado transmitido às crianças pelo seu ambiente familiar. Em primeiro lugar, porque é a família que estabelece a identidade de meninos e meninas como leitores ao demonstrar a importância dos livros. Isso envolve ler histórias com frequência para os mais novos, levá-los a bibliotecas, modelar esse comportamento desde cedo. Em segundo lugar, a família equipa a criança com os pré-­requi­sitos para o aprendizado. E, nesse sentido, é crucial entender que a linguagem escrita é mais rica e complexa que a falada. Estudos revelam que há maior riqueza verbal nos álbuns ilustrados pré-escolares do que em qualquer conversa, desenho ou programa de TV infantil. Daí a importância da leitura compartilhada entre pais e filhos. Ela deve começar cedo — entre 3 e 6 meses de vida, segundo pesquisas — e continuar pelo maior tempo possível. Muitos pais deixam de fazer isso quando percebem que os filhos já começam a ler de forma independente. Mas é um erro porque, nesse momento, a criança não está aprendendo a ler de fato, e sim a decodificar o que está escrito. Ler não é só decodificar. Exige compreensão. Quando a atividade é feita em família, ajudamos os mais novos a desenvolver as competências para ler com autonomia, a lidar com textos mais complexos e, portanto, mais enriquecedores, e a preservar a alegria da leitura. Não podemos esquecer que, nesse início, ler exige esforço e o prazer nem sempre é imediato. E, sem prazer, não haverá leitor. Por fim, os estudos mostram que as escolas não conseguem cumprir esse papel tão bem como as famílias. Não quero dizer que os professores sejam incapazes ou não possam ler histórias. Mas eles têm um tempo limitado para essas atividades, geralmente feitas em grupo. Nesse aspecto, a família proporciona um ambiente insubstituível.

Muitos adultos tentam estabelecer ou resgatar o hábito de leitura, mas falham e abandonam a empreitada. Que conselho dar a eles? Perseverem. Reduzam o tempo de uso recreativo das telas, que consomem parte significativa de nossas vidas, e tentem incorporar a leitura no dia a dia. Sugiro, por exemplo, reservar de vinte a trinta minutos à noite, antes ou depois do jantar, o que pode ser feito com as crianças, no modo “Agora estamos lendo”. Porém, é fato que muitas pessoas cresceram sem ler o suficiente, deixando de absorver a linguagem mais complexa e diversa que caracteriza os livros. Esses são casos mais desafiadores, porque exigem que o sujeito se familiarize com os livros. Isso leva tempo! E é melhor começar com livros não tão exigentes, tendo ao lado um dicionário para checar palavras cujo desconhecimento possa dificultar a compreensão. Em suma, começar a ler tarde na vida não é impossível, mas é mais difícil do que quando essa habilidade é desenvolvida gradualmente ao longo do tempo.

Seu livro enfatiza o poder da ficção escrita. Por que contos, novelas e romances são tão especiais para o nosso desenvolvimento e bem-­estar psíquico e social? As obras escritas concentram, para começar, uma maior abundância em termos de linguagem e conhecimentos gerais quando as comparamos a filmes, séries, programas de TV… A beleza da leitura é que absorvemos tamanha riqueza até incidentalmente, mesmo sem perceber. Quando se trata de sucesso acadêmico e capacidade intelectual, não há substituto para os livros. Eles têm uma influência positiva e documentada no QI, na criatividade, nas habilidades escritas e orais. Acontece que os livros de ficção também impactam nossas habilidades sociais e emocionais. Nenhum outro meio permite acesso tão direto e profundo aos pensamentos e sentimentos dos personagens. Entramos na cabeça deles e, mais do que isso, podemos vivenciar aquelas emoções. Pesquisas indicam que as mesmas redes cerebrais são ativadas quando essas sensações são experimentadas por meio da leitura ou evocadas por eventos da vida real. São características que promovem a empatia, a capacidade de compreender os outros e a si mesmo. Os livros de ficção nos tornam literalmente mais humanos.

Livros de papel, em áudio, digitais… Os novos formatos se equivalem ao tradicional quando pensamos na captação do conteúdo? Existem inúmeros estudos que compararam o grau de compreensão e memorização de um enunciado apresentado em diferentes meios: papel, eletrônico e áudio. Os resultados revelam duas coisas. Quando o trecho é simples, não há diferença entre eles. Mas, quando ele é complexo, emerge a superioridade do papel. No formato impresso, conseguimos nos concentrar melhor, esclarecer mais facilmente mal-entendidos e, diante daquela unidade espacial, navegar dentro do texto, o que repercute na hora de recordar elementos e fazer uma representação mental do que foi escrito. O cérebro se orienta melhor no livro físico do que numa estrutura virtual. Isso não quer dizer que os outros meios devam ser banidos. É preferível que crianças ouçam audiobooks ou leiam livros digitais do que desperdicem anos decisivos na Net­flix, no Tik­Tok ou no videogame. É como escreveu Umberto Eco: “O livro é como a colher, o martelo, a roda ou o cinzel. Depois de inventá-los, você não poderá fazer nada melhor”.

Publicado em VEJA de 5 de abril de 2024, edição nº 2887

Texto e imagem reproduzidos do blog: otambosi blogspot com

domingo, 24 de março de 2024

Fundador da Livraria Cultura, morre aos 83 anos

Legenda da foto: Pedro Herz, fundador da Livraria Cultura, em foto de 2017 | Crédito da foto: © Editora Planeta

Publicação compartilhada do site PUBLISHNEWS, de 19 de março de 2024

Pedro Herz, fundador da Livraria Cultura, morre aos 83 anos

Por Guilherme Sobota

 Velório será no Cemitério Israelita do Butantã na quarta-feira (20), às 10h

O livreiro e fundador da Livraria Cultura, Pedro Herz, morreu nesta terça-feira (19), aos 83 anos, em São Paulo, após um ataque cardíaco. O velório será no Cemitério Israelita do Butantã na quarta-feira (20), às 10h.

A morte foi anunciada por uma nota da Livraria Cultura nesta terça. "Pedro Herz foi um visionário no campo editorial, tendo desempenhado um papel fundamental no desenvolvimento e promoção da literatura em nosso país. Sua paixão pela leitura e seu compromisso em tornar os livros acessíveis a todos deixaram uma marca indelével na comunidade literária e além", diz o texto. "Sua ausência será profundamente sentida, mas seu legado perdurará através das páginas dos livros que tanto amou".

Pedro Herz nasceu em São Paulo em 1940, se formou em administração e viajou pela Europa, e viu a mãe, Eva Herz, se iniciar no mundo dos livros com uma Biblioteca Circulante, serviço de circulação de livros criado ainda nos anos 1940. Em 1969, mãe e filho decidiram fazer sociedade para fundar a Livraria Cultura, que primeiro se estabeleceu em lojas menores em São Paulo até chegar ao Conjunto Nacional.

As primeiras funções de Herz no mercado diziam respeito à negociação com editoras como Cultrix, Perspectiva, Zahar e Brasiliense, e depois ele também passou a importar livros para vender na loja.

Pedro Herz assumiu a Livraria Cultura em 2001, com a morte de Eva, e iniciou o período de maior expansão da rede: a Cultura chegou a ter 18 lojas pelo Brasil, comprou a operação brasileira da Fnac e a Estante Virtual, recebeu prêmios de reconhecimento de marca e arquitetura e chegou a ser eternizada em uma crônica de José Saramago. Em 2010, Pedro Herz recebeu a Ordem do Ipiranga, a maior honraria do Estado de São Paulo. Desde 2007 dividindo as funções de administração com os filhos, ele se afastou do dia a dia da gestão da Livraria em 2011, quando Sergio Herz já tinha o cargo de CEO da empresa. Na época, Pedro ainda liderava um conselho de administração da Livraria.

Em 2015, Pedro Herz passou a apresentar um bate-papo com autores, editores e ilustradores, no programa de televisão Arte 1 com texto. Anos depois, o programa migrou para o canal do Youtube da Livraria Cultura, com o nome Sala de Visita.

Em 2017, Pedro Herz lançou um livro de memórias, O livreiro (Planeta), em que conta a história da família e casos da Livraria, de perseguições sofridas na ditadura militar e também lançamentos curiosos, como de Vinicius de Moraes.

A Livraria Cultura atravessa uma crise severa desde 2018, quando entrou com um pedido de recuperação judicial. Atualmente, a empresa aguarda o julgamento de recursos no STJ que devem definir a situação sobre sua falência.

Em fevereiro, uma decisão do Tribunal negou um recurso da Livraria e autorizou a continuidade de uma ordem de despejo sobre o imóvel no Conjunto Nacional.

Veja nota da Livraria Cultura:

"É com profundo pesar que a família Herz comunica o falecimento do renomado livreiro Pedro Herz aos 83 anos, na madrugada de hoje 19/03/2024.

Pedro Herz foi um visionário no campo editorial, tendo desempenhado um papel fundamental no desenvolvimento e promoção da literatura em nosso país. Sua paixão pela leitura e seu compromisso em tornar os livros acessíveis a todos deixaram uma marca indelével na comunidade literária e além.

Sua ausência será profundamente sentida, mas seu legado perdurará através das páginas dos livros que tanto amou.

Neste momento de luto, a família agradece o carinho e condolências.

Velório será no Cemitério Israelita do Butantã, 20/03/24 a partir das 10hs, enterro às 12h".

Texto, imagem e vídeo reproduzidos do site: www publishnews com br

 

sábado, 27 de janeiro de 2024

Quem gosta de sebos? E quem gosta de catar livros...

Artigo compartilhado do site CARLOS ROMERO.

Res derelicta

Quem gosta de sebos? E quem gosta de catar livros no lixo?

Por Neide Medeiros Santos.

Conheci um leitor compulsivo que não podia ver livros no lixo, ia logo examinando e às vezes levava para casa relíquias abandonadas. Certo dia encontrou uma Bíblia traduzida pelo português João Ferreira de Almeida no lixo de uma escola católica, fruto talvez de uma biblioteca escolar, e guardou com muito carinho o exemplar descartado. A tradução de João Ferreira de Almeida é considerada um marco da história da Bíblia, foi a primeira tradução do Novo Testamento a partir das línguas originais e o livro estava jogado no lixo. Quanto desperdício!

Quem se lembra do antigo costume de escrever poemas dos poetas preferidos em cadernos? Só gente bem antiga se lembra disso. A professora Ana Lúcia Teixeira de Carvalho, em entrevista concedida à equipe do projeto “Redescobrindo as trilhas de Augusto dos Anjos”, contou que seu pai deu à noiva ( sua mãe) um caderno com poemas de Augusto dos Anjos, tudo escrito à mão.

Pois bem, voltemos ao leitor maníaco por livros. Não faz muito tempo, nosso amigo resgatou entre metralhas de uma construção um caderno de alguma moça sonhadora e romântica com poemas de Augusto dos Anjos, 

Raul Machado, Américo Falcão, Anayde Beiriz. Os poetas mortos estavam todos vivos naquele caderno com letra manuscrita, caligrafia de moça caprichosa. O caderninho ia virar papel reciclado.

A historiadora Lúcia Guerra conseguiu reaver uma 1ª edição do livro “A Paraíba e seus problemas”, de José Américo de Almeida. O livro estava em um depósito de lixo da maçonaria Branca Dias, na Avenida General Osório. Só não teve um triste fim porque uma pesquisadora, ciosa do valor de livros antigos, recolheu-o e ofertou à Fundação Casa de José Américo.

Nos arquivos do filósofo Walter Benjamin, foi encontrado o desenho de Angelus Novus, de Paul Klee. Há um detalhe sobre o destino desse trabalho de Klee. Antes de deixar a capital francesa, onde se encontrava refugiado durante a 2ª. Guerra Mundial, Benjamin retirou o desenho da moldura, colocou-o numa mala junto com seus escritos, queria salvá-lo da catástrofe. Coube a Adorno ser depositário dessa preciosidade que hoje se encontra no Museu de Israel. Para chegar a esse museu, um longo caminho foi percorrido. A fúria contra os judeus pelos nazistas não poupava livros nem obras de arte.

Certamente há muitas histórias de resgate de preciosidades literárias e artísticas colhidas em lixo, depósitos abandonados, bibliotecas desativadas, metralhas de construção e nos arquivos pessoais.

Quem quiser saber o significado da expressão latina RES DELERICTA consulte um dicionário de latim ou pergunte ao professor Milton Marques Júnior, versado na língua latina.

O leitor compulsivo, referido no início deste texto, foi aluno do professor Paulo Bezerril na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Paraíba e lembrava que este professor gostava de repetir essa expressão em suas aulas de Direito Civil.

Texto e imagem reproduzidos do site: carlosromero com br

terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Do Facebook/A Vida Breve

Post compartilhado do Facebook/A Vida Breve, de 14 de janeiro de 2024

“O que transforma este mundo é o conhecimento. Percebes o que quero dizer? Nada mais pode mudar coisa algum neste mundo. Apenas o conhecimento é capaz de transformar o mundo, ao mesmo tempo que o deixa exactamente como é. Quando olhas para o mundo com conhecimento, percebes que as coisas são imutáveis e, ao mesmo tempo, estão em constante transformação.  Podes perguntar que bem isso nos faz. Vamos considerar a questão deste modo: o ser humano possui a arma do conhecimento para tornar a vida suportável. Aos animais, essas coisas não são necessárias. Os animais não precisam de conhecimento ou de qualquer coisa do género para tornar a vida suportável. Porém, os seres humanos precisam de algo e, com o conhecimento, podem fazer da própria intolerabilidade da vida uma arma, embora, ao mesmo tempo, essa intolerabilidade não seja minimamente reduzida. E é tudo.”

— YUKIO MISHIMA, pseudónimo de Kimitake Hiraoka (14 de Janeiro de 1925 — 25 de Novembro de 1970), romancista, poeta, dramaturgo, actor, realizador e nacionalista japonês, em excerto, que traduzimos, de “The Temple of the Golden Pavilion“ (1959).

Foto: O escritor, com os livros e o gato.

sábado, 25 de novembro de 2023

Resenha do Livro: "Napoleão...", de Adam Zamoyski


Canal no YouTube "Léguas e Letras" de Flávia.

Resenha do Livro: 'Napoleão - O homem por trás do mito', uma biografia escrita por Adam Zamoyski. 

sábado, 11 de novembro de 2023

Um Escritor na Biblioteca | Ruy Castro

Publicação compartilhada do site Biblioteca Pública do Paraná, em outubro de 2023

Um Escritor na Biblioteca | Ruy Castro

Da Redação

Além de ser um dos maiores biógrafos do país, Ruy Castro também é um aficionado por livros. No dia em que a Biblioteca Pública do Paraná completou 160 anos (7 de março), o escritor contou, entre outras coisas, como formou — ao longo de seis décadas — seu próprio acervo, hoje com mais de 25 mil títulos.

Castro abriu a temporada 2017 do projeto Um Escritor na Biblioteca e foi o primeiro autor a falar no novo auditório Paul Garfunkel, totalmente reformado, assim como outros ambientes da Biblioteca. No bate-papo mediado pelo jornalista Omar Godoy, ressaltou que, acima de qualquer atividade, é um leitor: “Deixaria de ser escritor tranquilamente para ser apenas leitor, se pudesse”. O primeiro livro de sua longa trajetória de leitor foi Alice no país das maravilhas, presente que recebeu aos 5 anos. Mas não havia livros na casa onde nasceu. Os seus pais, no entanto, eram compulsivos leitores de jornais e revistas — hábito que ele levou adiante por toda a vida.

O depoimento de Ruy Castro foi repleto de frases inspiradas, misturando informação com senso de humor — o que também acontece em sua crônica veiculada quatro vezes por semana na Folha de S.Paulo ou nas biografias que publicou, entre as quais O anjo pornográfico (1992), sobre a trajetória de Nelson Rodrigues, e Estrela solitária (1995), a respeito do percurso de Garrincha. Ao falar sobre a complexidade que é fazer uma mudança para quem acumula 25 mil livros, disparou: “É difícil transportar uma estante. Então eu andei fazendo isso no decorrer da vida, plantando estantes em todas as casas e apartamentos que morei”. 

Castro se definiu como um sujeito que veio ao mundo para impedir que as palavras morram. “Tento ser o mais claro, o mais objetivo, o mais simples possível ao escrever, mas às vezes me dou o luxo de colocar uma expressão de 1920, de propósito. Só para receber um comentário azedo do leitor: ‘Pô, esse cara precisa se reciclar, nem o meu avô usa mais essa palavra’. Mas eu faço de propósito mesmo.”

O mineiro de Caratinga radicado no Rio de Janeiro também comentou sobre as suas temporadas em redações de jornal e como foi pesquisar e escrever alguns de seus livros, entre os quais Chega de saudade: a história e as histórias da Bossa Nova (1990).

Grande leitor

Certa vez me perguntaram: “Ruy, você faz livros e trabalhou a vida inteira como jornalista, sente-se mais jornalista ou escritor?”. Respondi que as duas coisas, dependendo do instrumento que eu estou tocando no momento. Mas trocaria essas duas atividades por uma outra, muito mais importante para mim, que é ser leitor. Eu deixaria de ser escritor tranquilamente para ser apenas leitor, se pudesse. Hoje mesmo dei um pulo num sebo aqui em Curitiba, o Fígaro, e o Paulo, dono do local, pediu que eu autografasse um livro para a loja. Escrevi o seguinte: “Quando morrer, não quero ir pro céu, quero vir pro Fígaro”. E é verdade, após a morte, eu iria para um sebo, para uma biblioteca ou para qualquer lugar que tivesse livros, jornais ou até mesmo bula de remédio para ler. 

Primeiros livros

O primeiro livro que ganhei na vida e li foi Alice no país das maravilhas, uma edição da Companhia Editora Nacional, com tradução assinada pelo Monteiro Lobato. Ganhei esse livro no dia do meu aniversário de 5 anos. Já sabia ler, tinha aprendido com a minha mãe, lendo jornais. Por acaso, lendo a coluna do Nelson Rodrigues, “A vida como ela é”. Então aos 5 anos eu era capaz de ganhar um livro de presente, ler esse livro e gostar tanto que, dali uma semana ou duas, pedi ao meu pai para comprar um outro título. Ele me levou numa livraria e comprei Tarzan, o filho das selvas, uma edição linda, também da Companhia Editora Nacional, que era uma editora muito popular na época. Isso foi exatamente há 64 anos. Desde então eu não evoluí nada, continuo lendo, acumulando e me cercando de livros.

Plantador de estantes

Já morei em muitas cidades, em muitos apartamentos e muitas casas. Sempre que mudo para um lugar novo, as estantes da casa anterior não se encaixam, porque uma estante é feita, geralmente, para um lugar específico. É difícil transportar uma estante. Então eu andei fazendo isso no decorrer da vida, plantando estantes em todas as casas e apartamentos que morei. Agora, como eu estou batendo todos os meus recordes, morando no mesmo lugar há 25 anos, e de onde espero sair só para o [cemitério] São João Batista, tenho mais possibilidade de me organizar em termos de possuidor de livros.

Biblioteca sobre o Rio

Posso dizer, não sei se com orgulho ou com vergonha, que no meu apartamento tenho 11 estantes, algumas delas maiores do que essa tela [do auditório]. Só de livros sobre o Rio de Janeiro, tenho 5 mil, de vários séculos. Tenho muito livro sobre cinema, sobre música popular, de muitos países e épocas, muitos livros de referência, dicionário de baianês, de filosofia, etc. Tenho dicionários lindos, do século XIX, contendo palavras que não se usam mais, dicioná- rios de francês com expressões que nem na França mais se usam. Tenho muita pena de me desfazer desse tipo de livro. Afinal, por que vou me desfazer? Parece um crime me livrar de um livro porque ele contém palavras que não se usam mais. 

As palavras não morrem

Às vezes eu até acredito que vim ao mundo para impedir que as palavras morram. Faço quatro vezes por semana uma coluna na página 2 da Folha de S. Paulo, em que tento ser o mais claro, o mais objetivo, o mais simples possível ao escrever, mas às vezes me dou o luxo de colocar uma expressão de 1920, de propósito. Só para receber um comentário azedo do leitor: “Pô, esse cara precisa se reciclar, nem o meu avô usa mais essa palavra”. Mas eu faço de propósito mesmo. A gente deve lutar para que as palavras não morram.

Família

Na casa dos meus pais não tinha um livro sequer. Zero. Talvez tivesse A nossa vida sexual, do doutor Fritz Kahn, que era um livro muito conhecido na época. Mas não havia livros mesmo. Meu pai e minha mãe simplesmente não tinham interesse em livros. Porém, eram ávidos leitores de jornais e revistas. Assinavam diariamente o jornal do Assis Chateaubriand e o Correio da Manhã. E esses dois jornais chegavam pelo correio todo dia. Eles também compravam na banca a Última hora, do Samuel Wainer, até porque a minha mãe gostava de ler o Nelson Rodrigues. Meu pai, que era torcedor do Carlos Lacerda, comprava a Tribuna da Imprensa. Então eram quatro jornais todos os dias. Nos fins de semana, compravam outros impressos, como o Jornal do Brasil e a revista O Cruzeiro. Uma quantidade enorme de jornais e revistas entrava diariamente em casa, era uma montanha de papel. E eles não jogavam nada fora. Os jornais eram lidos e estocados, empilhados nos quartos dos fundos. Não sei porque faziam isso, nunca cheguei a conversar sobre esse assunto com eles. Mas era como se fosse assim: “aqui não se joga palavra fora”.

Leitor de jornais

Um dia eu aprendi a ler e descobri, maravilhado, no quarto dos fundos, aquelas pilhas de jornais e revistas. Comecei a ler jornais anteriores a minha data de nascimento. Nasci em 1948 e estava lendo jornais de 1945, 1946, 1947. Mas para mim era como se eu estivesse lendo o jornal do dia. E, de repente, descobri que essa história de não jogar jornal e revista fora era coisa de família. Um primo meu, que morava na Lapa, também tinha montanhas de Correio da Manhã empilhados, com aquele cheiro de mofo e poeira. Ele morava na Lapa, que só tinha prédio velho. E a minha tia, mãe desse meu primo, era asmática em último grau. Ou seja, em vez de usar aquela bombinha que as pessoas compram na farmácia, ela usava uma bomba de barbeiro para conseguir respirar. Naturalmente essa mania de não jogar jornal fora se transferiu para mim também. Deixo os jornais se acumularem uma semana. Aí, na hora do futebol, do jogo do Flamengo, pego a pilha e boto na mesa em frente à televisão. Como não suporto ver o Flamengo ser atacado, fico olhando para o jornal, vendo o que me interessa. Quando a bola está com o Flamengo, olho o jogo, mas aí o outro time recupera a bola e eu volto a ver os jornais. Recorto o que me interessa e jogo fora o resto.

Biblioteca Nacional

Durante alguns anos, uns 20 e tantos, tive um casamento maravilhoso com a Biblioteca Nacional do Rio. Alguns dos meus livros, como as biografias do Nelson Rodrigues e do Garrincha, foram feitos com a ajuda da Biblioteca Nacional. Eu passava meses e meses lendo coleções inteiras no microfilme. Algumas coleções não estavam microfilmadas e os exemplares só podiam ser manuseados por funcionários da biblioteca. Tive a honra de ter a possibilidade de acesso a esses exemplares. O funcionário da biblioteca trazia aquela encadernação maravilhosa em um carrinho e manuseava aquelas páginas. Ficava muito preocupado, porque, por exemplo, a coleção da Última Hora não estava ainda microfilmada. E isso com um jornal dos anos 1950 do século XX. Imagina só os impressos do século XIX ou XVII. Eu me sentia, na presença daquele objeto, como se estivesse em frente a um papiro egípcio. Tinha um respeito enorme por aquilo. Torcia para que microfilmassem tudo logo, para o conteúdo ser eternizado. Hoje eu vejo com enorme satisfação que praticamente toda a BN está digitalizada, com a possibilidade de acesso pela internet. Ou seja: esses exemplares estão salvos.

Convicção no jornalismo

A descoberta do jornal, e do seu funcionamento, foi uma coisa que sempre me fascinou. A primeira página de um jornal é um mosaico, o mundo inteiro está ali. Antigamente a paginação era muito mais desorganizada do que hoje. Os jornais hoje são paginados — a primeira página, principalmente — de uma maneira coerente. Mas nos anos 1960 era muito confuso, era um mosaico mesmo. Eu achava aquilo fascinante e desde o começo me interessei pelo jornal. Naquela época havia muitos filmes, principalmente americanos, que se passavam dentro de jornais, mostravam as redações. Então não era preciso eu ir em um jornal para saber como era a redação. Eu já tinha visto no cinema. Isso sempre me fascinou e de cara decidi que queira ser jornalista. Nunca pensei em outra coisa.

Correio da Manhã 

Com o tempo decidi que queria ser jornalista do Correio da Manhã, que era o principal jornal do país naquela época. Um jornal fundado em 1901, com uma tradição liberal enorme e de grande importância na história da República. Um veículo que derrubou ministro, derrubou presidente, foi mantido proibido pelo Artur Bernardes durante anos, na década de 1920. E lá escreviam as pessoas que eu admirava, como o [Otto Maria] Carpeaux, o [Carlos Heitor] Cony e tantos outros. Então eu decidi que seria jornalista do Correio da Manhã e assim aconteceu. Em 1965, com 17 anos, escrevi uma carta para um jornalista do Correio dizendo que o admirava, me identificava com o que ele escrevia. Ele me respondeu, simpaticamente. Telefonei para o jornal, pedi para chamá-lo, ele veio ao telefone, falou comigo, me convidou para visitar a redação. Esse jornalista era José Lino Grünewald. A partir daí eu comecei a frequentar o Correio, inclusive cometendo a heresia de ser recebido pelo José Lino. Ele era editorialista e os repórteres eram proibidos de entrar na sala dos editorialistas. Eu chegava lá, batia à porta e conversávamos na sala dos editorialistas do Correio da Manhã. Além do José Lino, trabalhavam lá Franklin de Oliveira, Edmundo Moniz, Paulo de Castro, Nilton Rodrigues, Paulo Francis. Ou seja, só tinham os cobras lá dentro e eu ali, na maior naturalidade. Até que, em janeiro ou fevereiro de 1967, há exatamente 50 anos, o José Lino telefonou e me perguntou: “Você quer ser repórter do Correio da Manhã?”. Eu falei, “Quero, claro”. Foi assim que aconteceu.

Outros tempos

Naquela época tinha uma coisa espetacular que depois se perdeu. Você está na redação, é um repórter, quase um foca, e ao seu lado está um homem 30 anos mais velho, uma pessoa que você passou a vida inteira lendo e admirando. No meu caso, esse cara do meu lado era o Muniz Vianna, o maior crítico de cinema que o Brasil já teve, um homem que ensinou gerações inteiras sobre cinema. Na época ele fazia uma coluna diária de meia página sobre um filme. Então os jornalistas mais velhos iam aos jornais todo dia. O Franklin de Oliveira, por exemplo, era uma das grandes cabeças intelectuais do Brasil, lia em alemão, enfim, essas coisas impressionavam muito naquela época. Era amigo íntimo do Guimarães Rosa, um intelectual de alto peso. Foi quem inclusive criou a expressão “memória nacional”, em seu famoso livro Morte da memória nacional. O Franklin passava pela minha mesa e sempre me cumprimentava. Eu já era fã dele e nós conversávamos. Ou seja, você tinha essa convivência com os grandes nomes, porque os grandes nomes não se sentiam grandes nomes. Essa é a diferença. Eles conversavam com os focas, davam a maior confiança. Sempre me senti extremamente acolhido por eles, nunca fui esnobado. Praticamente com todos esses jornalistas a minha relação começou quando eles me dirigiram a palavra. O Paulo Francis, por exemplo. Lembro que estava sentado na minha mesinha do Correio da Manhã, isso deve ter sido em julho ou agosto de 1967, quando eu 8 Cândido | jornal da biblioteca pública do paraná Um escritor na biblioteca Um escritor na biblioteca vejo aquele cara parado do meu lado. Ele então pergunta: “Você que é o Ruy Castro?”. “Sou”, respondi. “Eu sou Paulo Francis”, ele disse. “Gostei muito do que você escreveu hoje no segundo caderno” (risos). Assim se deram as primeiras frases trocadas com o Paulo Francis.

Geração 

Não sei realmente se a minha geração era blasé ou o quê, se éramos muito convencidos ou metidos a besta, mas não havia uma relação de subserviência entre nós e eles. Ou eles eram extremamente abertos e cordiais ou não se levavam tão a sério a ponto de nos darem tanta confiança. Lembro que poucos meses depois, em março de 1968, estava entrevistando o Tom Jobim, lá numa mesa do bar Veloso, hoje Garota de Ipanema. O Tom tinha chegado há poucos meses dos Estados Unidos, onde tinha gravado um disco com o Frank Sinatra. Em 1968 o Tom já era o Tom, já estava cansado de ser o Tom Jobim. E eu tô ali com 20 anos de idade recém-feitos, o Tom com 41 recém- -completados. Então o Tom começou a me falar: “Meu pai foi embora de casa, quando eu era muito garoto. Não o conheci muito bem, mas esses dias eu tive um sonho com ele. Aliás, não foi sonho. Ele estava no quarto. Meu pai morreu eu tinha 6 ou 7 anos. Mas ele apareceu para mim agora, semana passada, no pé da minha cama, e falou para mim assim: "Ô, Antônio Carlos, deixa de ser preguiçoso, para de pescar e vai trabalhar”. Estou ouvindo aquilo e penso: “Poxa, eu aqui conversando com o Antônio Carlos Jobim, que acabou de gravar um disco com Frank Sinatra”. Naquela época, se você batesse no liquidificador os Beatles e os Rolling Stones, dava meio copo de Frank Sinatra. E eu estava conversando com um cara que tinha acabado de gravar um disco com o Frank Sinatra, sendo ele próprio Antônio Carlos Jobim e eu, com menos de um ano de profissão, aos 20 anos de idade, achando naturalíssimo estar ali. Pensava comigo que ninguém estava me fazendo um favor. Eu tinha o direito de estar ali. E ainda tinha o direito de contar que Tom Jobim acabava de me dizer que conversa com os mortos.

Tom 

Em janeiro ou fevereiro de 1988, fui entrevistar o Tom Jobim para a Playboy. Na verdade eu fui complementar uma entrevista que alguém já tinha feito com ele em Nova York, mas o jornalista não teve a coragem de fazer as perguntas que a Playboy gostava que se fizesse, ou seja, sobre a vida sexual do personagem. Como em todas as outras entrevistas que fiz para a Playboy, me preparei brutalmente para conversar com o Tom. Passei dias, semanas, lendo sobre o Tom. Fiz uma pauta com 200, 300 perguntas. E já fiz essas perguntas numa ordem que, praticamente, o leitor encontraria na entrevista. Era quase uma edição da entrevista na pauta. E a maneira de você fazer isso é começar com perguntas que o entrevistado vai gostar de responder. Boas perguntas, agradáveis, simpáticas, em que ele possa brilhar. E aí, quando ele já está bastante relaxado, pela 20ª ou 30ª pergunta, você entra com os assuntos que realmente interessam. Fiz isso com o Tom, gravei uma quantidade absurda de perguntas sobre a Bossa Nova, que eu sabia que não seriam usadas na edição final da Playboy. Fiquei com um material enorme.

Chega de saudade

Liguei para o Luiz Schwarcz, da Companhia das Letras, e falei: “Tô aqui com um material maravilhoso de uma entrevista com o Tom”. Conhecia todas as pessoas da Bossa Nova, já tinha entrevistado o Vinicius (que na época já havia morrido), o Carlinhos Lira muitas vezes, conheci a Nara Leão, tinha uma intimidade, inclusive física, com os ambientes da Bossa Nova. Embora fosse muito jovem pra ter frequentado, por exemplo, o Beco das Garrafas, sabia onde tinha sido o território da Bossa, não era um mistério para mim. E tinha uma grande curiosidade sobre as pessoas que tinham feito a Bossa Nova. Tanto que eu falei para o Luiz: “Não é um livro exatamente sobre a Bossa Nova, não é uma coisa só para acadêmicos, análise de letras de músicas, essa coisa chata que vivem fazendo. Vou contar a história de como começou, como foi feito o movimento, quem eram aquelas pessoas, o que elas faziam, como se reuniam, como se comportavam, namoravam, se sabiam música, se não sabiam, de onde tiraram a ideia da Bossa Nova”. E o Luiz topou na hora. Talvez fosse o único editor do Brasil naquela época que reagiria dessa maneira, porque ninguém queria saber de Bossa Nova.

Método de trabalho

Naquela época não tinha como aprender sobre biografia ou livro de reconstituição histórica com ninguém. Eu não tinha com quem conversar, tive que ir aprendendo no decorrer do trabalho. Mas logo de cara descobri que não poderia fazer igual os fascículos da Editora Abril, que davam uma aula de História que o leitor não pediu para ter. Pensei: “Está errado isso”. Tenho que contar uma história sem fugir da História, mas dando o contexto da época e do espaço onde tudo aquilo aconteceu. E como fazer isso? Eu concluí que fazendo perguntas. Perguntando às pessoas sobre a vida delas, se tinham carro, se não tinham, se pagavam aluguel, que uísque tomavam, se não tomavam, se namoravam (naquele tempo não tinha motel nem nada, tinha que namorar na praia, o chamado sexo à milanesa). A chave era ir fazendo perguntas sobre a vida pessoal e ir encaixando essas informações na medida que elas coubessem, para dar um contexto em volta do assunto principal, que era a música.

Os mais importantes

Ao longo do processo, fui aprendendo algumas coisas. Fui conversar com o Tom logo de cara. E ele me deu um baile. Só respondeu o que queria e me deixou chupando o dedo. E aí eu pensei: “Tá errado isso”. Essas pessoas muito importantes, como o Tom, o João Gilberto e o Carlinhos Lira têm que ser as últimas a serem entrevistadas. Tenho que aprender tudo sobre eles primeiro, pra depois ir conversar, de modo que não fujam das perguntas. E comecei esse trabalho, que leva anos (o livro da Bossa Nova levou todo o ano de 1988, de 1989 e quase todo o ano de 1990). Então dá tempo de você aprender quase tudo sobre o assunto e, quando for conversar com as figuras mais importantes, apresentar uma realidade em que são obrigadas a falar “sim” ou “não”. E normalmente falam sim, porque se falarem não e eu souber que é sim, vou jogar outra realidade em cima deles.

Não basta ser jornalista

Eu achava que um livro como esse [Chega de saudade] seria uma grande reportagem, mas aí eu rapidamente me convenci de que não era. Não tem nada a ver. Não adianta você ser um ótimo repórter. Isso não te tornará um bom biógrafo. Porque a biografia é outra coisa. Se você for um repórter, jornalista, realmente vai ter facilidade em localizar fontes, marcar uma entrevista, se preparar para essa entrevista, pegar as informações da conversa e organizá-las de maneira coerente. Em tudo isso realmente a imprensa te ajuda. Mas parou aí. Você tem que ter uma chamada cultura geral, que um jornalista nem sempre jornal da biblioteca pública do paraná | Cândido 9 tem. Porque se você tiver que aprender do zero, tudo o que está contido numa biografia, você vai levar dez anos para fazer. Então é preciso partir de um conhecimento amplo de certas coisas.

Trabalho monumental

Um trabalho de biografia ou de reconstituição histórica é composto de milhões e milhões de partículas de informações que o jornalista não tem e não é obrigado a ter. Como diz o Elio Gaspari, “Jornalista não tem que saber nada, tem é que aprender”. Mas para fazer um livro, você já tem que saber muita coisa de antemão. No caso do Chega de saudade, tive a ideia de fazer em livro porque era um assunto que eu já sabia ser muito amplo, que ocuparia tanto espaço que não caberia numa série de matérias de jornal. O veículo, para fazer isso, seria o livro. No que comecei a fazer o Chega de saudade, descobri a diferença entre trabalhar para jornal e para livro. A diferença entre você nadar num lenço úmido ou se jogar no oceano atlântico. O livro é o Oceano Atlântico, o lenço úmido era o artigo de jornal ou de revista. Mas o fato de você ter o espaço de um livro, de poder nadar à vontade, não te permite usar as palavras de maneira irresponsável. Tem que ser tão conciso ao escrever um livro como seria ao escrever um artigo de jornal. Só que você poderia escrever muito mais coisas em um livro. 

Contar uma história

Ao contrário de todos os livros de música popular feitos até então, que eram livros de análise de letra da MPB do ponto de vista sociológico, psicoló- gico, etc., o Chega de saudade não tinha nada disso. Tinha uma história. Não era um livro sobre a Bossa Nova, era um livro sobre as pessoas que fizeram a Bossa Nova, uma geração interessantíssima, fascinante, jovem, moderna, numa época espetacular do Brasil que até então era muito pouco estudada. O período Juscelino era muito pouco estudado. Hoje tem milhões de livros a respeito, mas em 1990 não tinha quase nada. Acho que foi a quantidade de informações, presente em Chega de saudade, que abarcava toda uma época e um contexto, que surpreendeu as pessoas.

Nelson

Descobri que queria fazer O anjo pornográfico no meio do Chega de saudade. Falei para o Luiz Schwarcz, “Assim que eu terminar o livro sobre a Bossa, quero biografar o Nelson Rodrigues”. E o Luiz, já irresponsavelmente na época, acreditava em tudo o que eu propunha para ele. Então já ficou definido que eu faria O anjo pornográfico, a biografia do Nelson Rodrigues, que não tinha esse título ainda.

Sem descanso

Quando fui fazer O anjo pornográfico, sabia que o livro seria julgado à luz do Chega de saudade. E seria, com toda a certeza, julgado desfavoravelmente. Então pensei o seguinte: “Em matéria de informação, tenho que passar com o trator em cima, dar marcha ré e passar de novo. Tem que ter mais informação ainda do que no Chega de saudade”. E foi o que eu fiz. Me empenhei para que tivesse mais informação. E o pior é que passei a usar isso como uma lei para mim mesmo: cada livro tem que ter mais informação do que o anterior. Por isso leva mais tempo para fazer. Chega de saudade e O anjo pornográfico levaram dois anos e pouco para escrever. O livro do Garrincha levou três. O livro da Carmen Miranda levou cinco. Ou seja: eu sempre me botando dificuldades a mais. Tem que ouvir mais gente, tem que ouvir mais gente mais vezes, tem que consultar a coleção inteira da revista tal, de 1930, tem que fazer isso, fazer aquilo, não posso descansar enquanto não apurar cada informação, cada pergunta que eu mesmo me tivesse proposto. A graça é exatamente essa: a cada problema que você propõe para o livro, tem que ir atrás da solução. Não pode descansar até solucionar. Isso é cláusula pétrea na preparação de uma biografia. 

Texto e imagem reproduzidos do site: www bpp pr gov br/Candido

Não é para Amadores: 200 Livros para entender o Brasil

A Leitura e a Transformação do Mundo...

A LEITURA E A TRANSFORMAÇÃO DO MUNDO, DE NÓS MESMOS E DA PRÓPRIA LEITURA.

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Você sabia que a forma como olhamos o mundo foi se diferenciando, isto é, o ângulo que os nossos olhos estabelecem para com os objetos foi sendo desenvolvido com o passar do tempo?

LER É DESCOBRIR

Ler é um processo amplo, contínuo e complexo que se aprimora conforme vamos observando o mundo e realizando novas leituras. Com a leitura, temos a possibilidade de acessar novas informações, e, também, novas descobertas, novos textos, novas abordagens sobre o mundo vão sendo construídas. É por isso que se pode dizer que tanto nós quanto a leitura se transformam.

Vamos iniciar observando a imagem:

A leitura e a transformação do mundo, de nós mesmos e da própria leitura.

Nossa primeira leitura provavelmente seja: é uma caverna.

Se nos detivermos mais atentamente perceberemos que não se trata de uma caverna qualquer.

Se já tivermos realizado algumas leituras sobre manifestações rupestres, a leitura dessa imagem poderá nos provocar perguntas que fazemos, ou não, sobre essa necessidade humana de registrar algo, de deixar registradas as suas histórias.

E daí, dependendo de nossa curiosidade, de quanto esse assunto nos chama a atenção, de quanto estamos com certa disponibilidade (de tempo e emocional), poderemos procurar novas informações sobre o assunto e realizar novas leituras. 

Agora, imagine um antropólogo, alguém que tem se dedicado a ler essas manifestações, se deparando com uma caverna assim? Certamente a leitura que ele realizará dessa caverna será diferente e novas abordagens de leitura serão apresentadas, transformando, inclusive, posteriormente, a qualificação da nossa leitura em relação a essa mesma imagem.

Vamos para outra imagem:

A leitura e a transformação do mundo, de nós mesmos e da própria leitura.

É uma cena de pessoas caminhando em uma calçada. Que calçada é essa? A calçada dessa rua sempre foi assim?

A leitura dessa calçada provoca outras análises, porque, diferente da imagem da caverna, a imagem dessa calçada foi transformada quando, a partir de leituras diversas, se constatou que, nessa cidade, por mais que houvesse também pedestres negros circulando, nem sempre eles conseguiam ver registradas as suas pegadas.

A leitura da imagem dessa calçada, tal como se apresenta hoje, só é possível uma vez que leituras diversas a respeito dessa cidade foram sendo apresentadas: a leitura pode transformar o mundo, transformar a nós mesmos e transformar a própria leitura.

A LEITURA NÃO SE RESTRINGE AO CONHECIMENTO DO CÓDIGO ESCRITO.

Por um bom tempo se considerou a leitura como a decodificação de palavras. Desde a segunda metade do século XX, é praticamente impossível se considerar que alguém estará completamente incluído socialmente se desconhecer os mecanismos da leitura escrita. Mas saber ler o que está escrito não revela toda a potencialidade do que é ser um leitor.

Por mais que existam várias formas de se ler o mundo, atualmente é inviável não considerar que ter acesso e conhecimento da leitura escrita deva ser um direito e um dever de todos. Isto é, todos devem poder ser incluídos ao mundo da escrita, a fim de poder ter acesso aos registros históricos, às narrativas de todos os tempos e culturas.

Há muitas formas de, a partir da leitura, transformar a leitura, ou seja, é dever de todos, da comunidade e da cidade, possibilitar interlocuções que promovam essa atividade.

Da parte institucional, existem frentes como as desenvolvidas pelo SESI: Dia da Leitura, ações nas unidades do SESI e empresas, Bibliotecas, Escolas e Formação Continuada. Mas também é possível desenvolver ações no do dia a dia, como , por exemplo, em conversas com colegas, ao emprestar ou sugerir livros, propor no local de trabalho dez minutos para relatos do que está sendo lido etc. 

E A LEITURA DE LITERATURA?

A importância da literatura, a importância do resgate de nós mesmos por meio do que os escritores de tempos e locais distintos têm para nos contar é essencial para a manutenção de uma sociedade.

Contar de nós mesmos nos constitui enquanto seres humanos. Assim, além da garantia do acesso à leitura, é fundamental que todos possamos desenvolver práticas em relação à leitura de literatura. Como assegura o crítico literário brasileiro Antonio Candido, criador da teoria relativa à análise do que seja literatura além de critérios de estrutura ou apenas intrínsecos ao texto, tratar de literatura tem como mais importante um sistema literário: com escritores, produção escrita e leitores, sem pressuposições restritas e engessadas.

A importância da leitura de literatura diz da necessidade de nos confrontarmos a partir das angústias, das alegrias e tristezas, dos desafios, do novo e, às vezes, incômodo confronto com o outro.

Com a leitura de literatura temos a possibilidade de, com os outros e as outras, de séculos e décadas passadas, de regiões hoje inexistentes, de lugares que nunca teríamos sequer a curiosidade de conhecer, de lugares próximos que nossa inconsciência da existência nunca nos permitiu ver, com espaços até então ainda não existentes, olharmos como somos e, nem que seja por alguns minutos, experimentar no ato solitário que pode ser a leitura de um livro, as novas possibilidades de sermos o que quisermos ser e, de experiências em experiências, vislumbrar concretudes para essas possibilidades.

Ter acesso a livros de literatura - de vários tamanhos, com capas de gramaturas diversas, com muitas ou poucas páginas, com histórias simples ou bastante complexas – é também direito de todos nós. Nesse sentido, as Bibliotecas acabam sendo o local privilegiado para a garantia desse direito, mas, ainda bem, novos locais começam a também permitir esse acesso: refeitórios, transporte coletivo etc.

“A leitura tem muito a ver com o espaço, ela se relaciona com os alicerces espaciais. Ela parece ser um caminho privilegiado para encontrar um lugar, se acomodar, ali fazer seu ninho.”

Michèle Petit, in: Ler o mundo – experiências de transmissão cultural nos dias de hoje. São Paulo: Editora 34, 2019.

Talvez o que todos nós queiramos é ter o direito de ver nossas histórias gravadas em uma caverna. E todos nós queremos ter ao menos uma caverna.

Que todos realizem muitas leituras e que tenham a felicidade de encontrar livros de literatura que lhes permitam dialogar, mesmo que através da oposição, consigo mesmos.

Como sugestão para ampliação dos temas aqui tratados, apresentamos os links de duas lives da Equipe de Formação de Professores:

Leitura como concepção de um mundo diverso.

Leitura e Literatura: modos de (re) existir.

Para conferir: https://bit.ly/AOVIVOEFP

Joice Welter Ramos

Atualmente é Coordenadora da Área de Linguagens da Equipe de Formação de Professores na GEDUC SESI-RS. É licenciada em Letras pela UFRGS, professora de Língua Portuguesa e leitora contumaz.

22 de Abril de 2021 

Texto e imagens reproduzidos do site: www sesirs org br

quarta-feira, 12 de julho de 2023

Milan Kundera, morre aos 94 anos

Texto publicado originalmente no site G1 GLOBO, em 12 de julho de 2023 

Milan Kundera, autor de 'A Insustentável Leveza do Ser', morre aos 94 anos

Escritor vivia em Paris, na França, para onde foi exilado após ser condenado na República Tcheca por criticar invasão soviética.

Por g1

O escritor tcheco Milan Kundera, autor de "A Insustentável Leveza do Ser" - um dos principais romances do século XX - morreu em Paris aos 94 anos. A informação foi divulgada nesta quarta-feira (12) pelo grupo editorial francês Gallimar.

A TV estatal da República Tcheca também anunciou a morte de Kundera, que nasceu na cidade tcheca de Brno em 1929. Ele vivia em Paris desde 1975.

O escritor se exilou na França à época, após ser condenado em seu país natal por criticar a invasão de tropas soviéticas à Tchecoslováquia em 1968, que reprimiu a Primavera de Praga, como ficou conhecido o movimento de democratização feito pelo governo da época.

Em seu primeiro romance, "A Brincadeira", de 1967, ele retratou e satirizou o regime comunista da Tchecoslováquia.

Kundera chegou a perder a nacionalidade tcheca e foi naturalizado francês. Anos depois, ele ganhou o Prêmio Nacional de Literatura de seu país de origem.

O autor era elogiado por seu estilo de retratar temas e personagens que flutuavam entre a vida cotidiana e o mundo das ideias. Seu livro mais famoso, "A Insustentável Leveza do Ser", lançado em 1984, é considerado um dos principais romances do século XX.

Segundo a editora Gallimar, Kundera morreu na terça-feira (11) na capital francesa. A causa da morte ainda não havia sido divulgada até a última atualização desta reportagem.

'A Insustentável Leveza do Ser'

Um dos principais romances do século XX, "A Insustentável Leveza do Ser", lançado em 1984, inicia justamente com tanques soviéticos rodando por Praga, a capital tcheca, onde o autor viveu até 1975, quando se exilou em Paris.

Amarrando temas de amor, exílio, política com um texto profundamente pessoal, a obra foi aclamada pela crítica e deu a ele reconhecimento, com um grande número de leitores entre os ocidentais, que abraçaram tanto sua subversão antissoviética quanto o erotismo presente em muitas das suas obras.

A história tem como pano de fundo a Primavera de Praga, em junho de 1968, com a invasão soviética do país que durou até agosto daquele ano. A trama segue um cirurgião de Praga, que se exilou em Geneva e retorna para casa.

Ao se recusar a se curvar ao regime comunista, Tomás se torna um lavador de janelas e usa sua profissão para ter relações sexuais com suas clientes. Ele abraça a "leveza" e justifica suas ações com base na fidelidade emocional que tem por sua esposa, Tereza.

Uma de suas amantes, Sabina, uma talentosa artística plástica, cuja a obsessão sexual briga com a de Tomás, conduz a "leveza" ao extremo com sua total falta de compromisso com os outros. Já Tereza é a personificação do "peso", principalmente por se entregar de corpo e alma ao seu marido, além de seus ideais políticos. Tomás e Tereza acabam seus dias em uma vida tranquila no campo.

O livro foi publicado em inglês e francês em 1984. No ano seguinte, foi lançado no original tcheco e rendeu a ele o Prêmio Nacional de Literatura, ainda que proibido na Tchecoslováquia até 1989.

Jiri Srstka, o agente literário tcheco de Kundera na época em que o livro foi finalmente publicado na República Tcheca, disse que o próprio autor atrasou seu lançamento por temer que fosse mal editado.

"Kundera teve que ler todo o livro novamente, reescrever seções, fazer acréscimos e editar todo o texto. Portanto, devido ao seu perfeccionismo, este foi um trabalho de longo prazo, mas agora os leitores receberão o livro que Milan Kundera acha que deveria existir", disse Ststka à Rádio Praha na época.

Texto reproduzido do site: g1 globo com/pop-arte

sábado, 1 de julho de 2023

"Gosto bastante das estantes..." (Pedro Doria)







Post compartilhado do Facebook/Pedro Doria, de 30 de junho de 2023 

Gosto bastante das estantes dessa semana. Dos lugares em que elas estão. Porque estante não é só o jeitão, né? A disposição ou cor das prateleiras, o desenho no qual se encaixam, é também, e fundamentalmente, o jeito como se estabelecem no ambiente. O ambiente que criam. Precisa ser um canto que convide de algum jeito, no qual a gente senta e relaxa, desliga, não se distrai. Onde podemos mergulhar.

Essa luz de cinco da tarde na primeira foto, a golden hour, a costela de adão invadindo o sofá, tanto livro para ver, os objetos intercalados entre os livros. E não é só. Reparem a ligeira inclinação de alguns dos volumes, os espaços aqui e ali entre livros na prateleira. Essa aí é uma estante viva, consultada. Quem não quer sentar aí no fim da tarde, talvez duma sexta-feira, e se perder?

É o mesmo com a seguinte e a terceira. Ambas são pura luz, e essa luz amarelada que relaxa como só. Tire o azul da luz e a gente já quer recostar. Gosto bem mais da segunda, talvez seja minha queda brasileira por arquitetura moderna, mas recostar sob a Audrey Hepburn, essa árvore à frente, dve ser uma delícia. Embora as luminárias tão bem colocadas da terceira tenham seu valor.

A integração da quarta estante com a escada é uma beleza. Não sei quem tem uma casa sofisticada assim, mas é uma beleza. Até porque aproveita espaço, né? Livro ocupa espaço que é uma coisa. Noutra semana eu certamente destacaria a quinta estante, tudo é muito charmoso, mas é que nessa. Sei lá. Entrei no clima do fim da tarde — o que fez daquele clima meio primeira metade de século 20 da penúltima soturno, né?

A última estante, integrada à cama. Olha… Não é má ideia.

Texto e imagens reproduzidos do Facebook/Pedro Doria

quarta-feira, 7 de junho de 2023

Alguns usos do livro

Legenda da foto: Quando a leitora é jovem, os livros servem para assustar os namorados

Publicação compartilhada do site TÍPICO LOCAL, de 6 de junho de 2023

Alguns usos do livro 

Quem tem TOC pode usar uma quantidade boa de livros para se distrair catalogando, colecionando, descobrindo formas de organizar o acervo

Por Clotilde Tavares

Usos do livro? Como assim, pergunta você, meu razoável e esclarecido leitor. Livro é uma coisa que tem somente um uso, e que se resume à leitura do seu conteúdo. Você entende a importância da leitura, sabe que o livro é um veículo adequado à transmissão e à propagação do conhecimento; que é um objeto que tem muitas características, quanto a tamanho, aparência, número de páginas, e aos diferentes conteúdos, mas uso mesmo você não consegue imaginar outra coisa para fazer com o livro a não ser lê-lo, ou ignorá-lo, se for o caso em que o conteúdo não lhe desperte interesse. Nesse caso, coloca-se o livro em algum lugar e esquece-se dele. 

Agora em abril contei os livros que tenho em casa. São cerca de 2.300, de todo tipo e gênero, e alguns eu tenho desde a minha mais antiga infância. Já tive mais, já tive mais de três mil, mas sempre estou doando. Pois bem: eu, que tenho livros em casa, vou lhe contar alguns usos deste objeto que você nem imagina, e que não têm nada a ver com o ato da leitura.

Quem tem TOC, mesmo na sua forma moderada, pode usar uma quantidade boa de livros para se distrair catalogando, colecionando, descobrindo formas de organizar o acervo. Organizar uma coleção de dois mil e tantos livros: supremo prazer. Isso requer toda uma operação prévia de planejamento, porque os métodos consagrados pela biblioteconomia jamais servem para os nossos próprios livros. A nossa forma não só é a melhor, como a mais funcional e produtiva, e a gente simplesmente não entende porque não é adotada ainda pelas grandes bibliotecas do país. E assim, começamos geralmente pelos critérios que iremos adotar para arrumá-los, como autor, estilo, ou gênero, clássicos ou contemporâneos, ensaio, poesia ou ficção, deixando juntos todos os de Cascudo, os de Borges, os de Suassuna, os de teatro – e agora, como fazer? O Auto da Compadecida fica junto com os de teatro ou com os de Suassuna? Devo comprar um segundo exemplar, para que nenhuma das categorias fique inferior à outra? E mergulhada nessas questões vejo passar a tarde, ou a noite, e a diversão é garantida.

Outro uso do livro é ocupar as mãos enquanto a cabeça precisa resolver um problema. Nesses casos, é preciso colocar uma mesinha auxiliar junto da estante, e ir tirando os livros da prateleira, com lentidão e carinho, um a um, folheando, revendo dedicatórias, procurando grifos antigos ou papeizinhos entre suas páginas, ou simplesmente tendo-os entre as mãos, distraída, como se alisasse o dorso de um gato ou brincasse com as orelhas de um cachorro. Os livros vão se amontoando sobre a mesa, a prateleira fica nua, pronta para o pano que vai tirar aquela poeira – e nada de pano úmido porque umidade não combina com livro. A cabeça, cercada pela afetuosa presença e manuseio dos livros queridos, fica relaxada, confortável, tranquila e de repente, voilá! Aparece a solução perfeita para aquilo que estava exigindo uma decisão, uma resposta, um encaminhamento.

Quando a leitora é jovem, os livros servem para assustar os namorados. Eu nunca compreendi porque aquelas criaturas cujos cérebros louros e bronzeados que só entendiam de marés e pranchas achavam que tinham que ler para poder namorar uma leitora. Entravam na minha casa e diziam: Mermão, vou ter que ler isso tudo? Era o comentário dos filhos de Poseidon, semideuses das ondas e dos ventos, ao se depararem com aquelas paredes cobertas de livros. Eu perguntava: Rapaz, eu vou ter que me equilibrar numa prancha e surfar? Claro que não, diziam. Aí eu encerrava: Então você não precisa ler tudo isso. Bora ali, bora conversar um assunto – e a gente ia brincar de Eduardo e Mônica.

Um dos meus usos preferidos para o livro é quando acordo de manhã e abro a porta do quarto para o resto do apartamento, cheio de livros, que passaram a noite ali, fechados, exalando e concentrando seu maravilhoso cheiro de madeira adocicada. Eu inspiro e encho o pulmão com o melhor perfume do mundo, odor de árvores antigas, de mel, de sementes doces, olhando aquelas lombadas amadas, berço de histórias lidas, relidas ou ainda não lidas, mas que já estão comigo, e que me cercam de doses de carinho e afeto cuja intensidade os humanos desconhecem. 

Mas o melhor momento é quando paro a leitura porque um trecho me emocionou ou me fez refletir, e coloco o livro aberto sobre o peito, sincronizando meu coração com o dele. Desce sobre mim a calma dos abençoados, cerro devagar os olhos, e tenho a certeza de que, enquanto o mundo ferve lá fora, eles sempre estarão ali comigo e nunca, nunca, nunca irão embora, nunca me deixarão sozinha.

Texto e imagem reproduzidos do site: tipicolocal com br

Ler é viver muitas vidas sem precisar reencarnar

Publicação compartilhada do blog TODO PROSA, de 1 de junho de 2023

Ler é viver muitas vidas sem precisar reencarnar
Por Ricardo Soares*

    Jovem comprei muitos livros para o velho que hoje sou ler. Comprei tantos e tão compulsivamente, talvez iludido que ao comprá-los poderia ler todos. Fora os muitos livros que ganhei por deveres, prazeres e ofícios da profissão. 

    Agora olho para todos esses livros e rio complacente comigo mesmo. A ilusão de ler tanto como se não fosse preciso viver célere  e urgentemente. Isso provoca, por exemplo que um livro curto e desejado, comprado em 2 de agosto de 1985 só tenha a leitura concluída em 18 de maio de 2023. Um exemplo entre muitos. Quase 38 anos entre o gesto de comprar e a leitura consumada. Nesse interim o tal livro virou filme, sua autora morreu e eu visitei seu túmulo em Paris entre a compra do livro e a conclusão da leitura.

    Um dos fascínios do livro é isso. Sua aguda, ardente e longa paciência. Volumes eretos na estante que, às vezes, ficam 78 anos para serem lidos como ocorreu outro dia com um volume de contos de Eça de Queiroz,como está na grafia da edição portuguesa.

    Há livros que esperam muito mais e outros, quase que inexplicavelmente, são lidos na sequência , logo após serem comprados quando os tiramos de suas sacolas  e com eles deitamos em sofás ou camas.

    Esse prazer, esse mistério que envolve livros e leituras pode parecer pueril a quem não é afeito ao assunto. Mas, os que são compreenderão. E , tudo isso, para dizer o que? Que os livros , as palavras impressas, são atemporais e qualquer autor morto , medíocre ou genial, seguirá vivo assim que um leitor deitar os olhos sobre suas palavras, suas vírgulas, travessões, interrogações. Eu mesmo e essa tola crônica seguirá viva mesmoo depois de eu ter morrido no momentoo em que alguém ler tudo isso.

    Palavras serão imortais, vale o escrito, sempre, seja em que idioma ou grafia enquanto o planeta não for calcinado e as bibliotecas incineradas. Isso sem falar na destruição definitiva de qualquer biblioteca virtual nesses novos tempos de leituras por métodos que antes só imaginávamos.  

    O acumulo de livros e leituras é graveto sobre graveto, cordas sobre cordas, uma amarrando a outra a nos sustentarem à beira de abismos ou paraísos , conforme o gosto do leitor. Assim podemos ter certeza, não só Machado e Eça , Camões e Pessoa seguirão vivos mas qualquer Zé Mané autor de memórias próprias e póstumas seguirão vivendo se seus escritos forem lidos post mortem seja por um único ser humano.

    Bibliotecas imensas não podem ser lidas numa única vida e embora saibamos disso não abrimos mão do colecionismo literário. Falo por mim mas são muitos os que padecem dessa doce mazela ignorando o preceito de Schopenhauer que pregava que seria muito bom se ao comprar livros também comprássemos tempo para lê-los. 

    Não faço a menor ideia de quantos kms de livros li na vida se é que essa unidade de medida seja conveniente para auferir leituras. Mas sei mais ou menos o espaço que eles ocupam em minha casa e na minha vida e ao contrário de muitos não consigo me desapegar deles. Antes o contrário pois hoje , sem mulher , filhos criados, cães escovados eu me agarro aos livros como um náufrago ao seu bote , com perdão da obvia e surrada comparação.

    Os livros são meu alento, distração, dispersão e loucura e isso bem antes da pandemia que , aliás, só me fez ficar mais abraçado a eles. O mote é antigo e só o repito: não consigo imaginar uma vida sem livros ou sem ler. Que solidão barulhenta deve ser isso ! E desde a infância penso isso o que é curioso pois não venho exatamente de uma família de leitores.

    Apavorado fico imaginando o que seria minha vida sem ler. Que tédio rotundo, que despenhadeiro de monotonia e falta do que fazer apesar das louças a serem lavadas, as comidas a serem preparadas, os filmes e séries a serem assistidos. Posso lhes garantir que dá para fazer isso tudo e muito mais e ainda sobra muito tempo para ler. Por isso assumo uma certa arrogância e solto risos de desprezo quando a maioria de não leitores dizem não ler porque não tem tempo. Ora, "vão pentear macacos" como se dizia antigamente e inventem outra desculpa. 

    Se você é alfabetizado e tem um mínimo de poder aquisitivo não lê é por preguiça mesmo. Quem quer ler sempre arruma tempo para isso. E olha que nem vou aqui tergiversar sobre o sofrível índice de leitura dos brasileiros de todas as idades que associam o hábito a chatice e inação. Mal sabem quanta ação achariam em páginas que não frequentam. 

    É o hábito que faz o monge portanto se por gerações de famílias ninguém em casa lê será difícil aparecerem novos leitores. E nós, leitores, extintos não estamos, mas  parece que não proliferamos até por conta, agora, de tanta concorrência audiovisual e internética.

    O venerável Borges dizia que para ele o paraíso devia ser uma grande biblioteca o que se converteria em inferno para não leitores que olhando todos aqueles volumes enfileirados arrancariam os cabelos e as páginas dos livros para fazerem fogueiras . Afinal, o que faz um cego diante da escuridão ? 

  Meus olhos, cabeça,tronco e membros envelhecem , mas quanto mais eu leio  mais eu vejo e quanto mais vejo vivo muitas outras vidas além da minha. Da antiga Indochina até a África nem mais tão profunda , do Jequitinhonha ao Pelourinho , da Foz do Iguaçu à procura, sempre, de um bom novo caminho desculpem a obviedade, mas ler é viver muitas vidas sem precisar reencarnar. 

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* Ricardo Soares - Escritor, jornalista, roteirista, diretor de tv

Texto e imagem reproduzidos do blog: todoprosa blogspot com

quarta-feira, 19 de abril de 2023

Boris Fausto, morre aos 92 anos em São Paulo

Legenda da foto: Boris Fausto em foto de dezembro de 2006. - (Crédito da foto: Vidal Cavalcante/Estadão Conteúdo)

Publicação compartilhada do site G1 GLOBO SÃO PAULO, de 18 de abril de 2023 

Boris Fausto, historiador e cientista político, morre aos 92 anos em São Paulo

Sua principal obra, 'A Revolução de 1930 - historiografia e história', publicada pela primeira vez em 1969 é considerada um clássico das ciências sociais brasileiras.

Por Cíntia Acayaba e Cláudia Castelo Branco, g1 SP

Um dos maiores historiadores do Brasil, Boris Fausto morreu nesta terça-feira (18), em São Paulo, aos 92 anos. O velório será na Funeral Home, na região da Avenida Paulista, a partir de 8h de quarta-feira (19).

Seu primeiro livro, "A Revolução de 1930 - historiografia e história", propôs uma interpretação nova a respeito das classes sociais e das forças armadas no Brasil. Publicado pela primeira vez em 1969, é considerado um clássico das ciências sociais brasileiras.

Como foi lançado pouco depois do AI-5, durante a ditadura militar, um editor chegou a achar arriscado publicar. “Ele disse 'olha, do jeito que está o clima, não posso me arriscar a publicar esse livro", contou o historiador em documentário sobre ele lançado em 2018.

Autor de mais de 30 livros, incluindo grandes sucessos literários como "O Brilho do Bronze" e "O Crime do Restaurante Chinês", Boris tinha um olhar cuidadoso sobre os capítulos recentes do Brasil.

No documentário "Boris Fausto", o historiador disse acreditar que o Brasil "tem jeito".

“Depende de uma categoria complicada que são os brasileiros… os brasileiros políticos, os brasileiros da elite, os brasileiros do povo, os brasileiros da direita, os brasileiros da esquerda radical”.

“O funcionamento da democracia no Brasil se precarizou muito, mas eu continuo achando que o regime democrático é fundamental”, disse.

Ele também falou sobre "história" e "memória" no documentário ao comentar sobre o filme "Amnésia".

“Eu vi um filme, o Amnésia que tinha um personagem que só lembrava do que imediatamente aconteceu e ele era manipulado de todo jeito então acho que radicalizando na ficção o que pode haver é um desinteresse, uma desvalorização da História o que é uma forma de amnésia”.

Maria Aparecida Aquino, professora de História da USP, diz que Boris era um dos maiores historiadores do Brasil: “Se não o maior”. Suas lembranças com Boris vão de debates em frente às câmeras a bancas de trabalhos acadêmicos.

"Muito gentil, um cavalheiro. Uma pessoa muito importante. Nós vamos sentir muita falta dele. Ele deu essa dimensão nova sobre a República. Todos nós ficamos mais pobres com sua ausência."

Aquino considera o período da sua pesquisa que cobre a revolução de 30 a mais importante. “É a que gosto mais pela compreensão ampla da República. “Temos uma dívida com ele por isso”.

“Bom ou ruim, eu sou mais escritor”

Em entrevistas, Boris explicava que a escolha pelo crime como gênero literário era um caminho para adentrar à chamada microhistória, abordada inicialmente pelo historiador francês Emmanuel Le Roy Ladurie. É onde, por exemplo, “ O crime do restaurante chinês” se enquadra.

Entre o romance policial e a história do Brasil, ele narra um dos acontecimentos policiais que mais mobilizaram a opinião pública paulistana. Boris era um menino quando, depois do carnaval de rua, um homem negro foi acusado de matar o ex-patrão chinês e mais três pessoas com golpes de pilão. Ocorrido em 1938, o crime é o mote para abordar a relação entre migrantes, imigrantes e trabalhadores marginalizados numa São Paulo de intensas transformações socioeconômicas e culturais.

Boris também escreveu Crime e Cotidiano. A Criminalidade em São Paulo. Os trabalhos sobre crime e criminalidade foram premiados pela American Sociological Association em 1999.

"(Por que crimes ficam na memória coletiva?) São as coisas que impressionam muito as pessoas. Tem um impacto muito grande. Passam de pai pra filho. Mãe pra filha. Mas há também crimes que desaparecem e você precisa desenterrar porque eles são muito interessantes", disse em entrevista ao Programa do Bial.

Último livro

Em março de 2020, começo da pandemia, Boris conversou com seu filho, o sociólogo Sergio Fausto, e a jornalista Renata Lo Prete, em um episódio do podcast "O Assunto". Pai e filho contaram como faziam para matar a saudade, a rotina em quarentena e os planos para quando tudo voltasse à normalidade.

Em 2021, Boris publicou "Vida, morte e outros detalhes". O livro nasceu a partir de um acontecimento pessoal: a morte do seu irmão Ruy Fausto no início da pandemia. A obra traz um conjunto de memórias e reflexões sobre relações familiares, as rivalidades do afeto, o envelhecimento e a finitude.

“Da minha parte, a pandemia fez reviver o passado, que se tornou uma presença cotidiana, e me aproximou, ainda mais, de meu irmão Ruy pela via do divertimento. Sua morte inesperada e essa aproximação me impulsionaram a escrever este livro, passo a passo, sem um esquema prévio”, escreveu Boris Fausto no início do livro.

Resultado do luto íntimo e pelo Brasil durante a pandemia de Covid-19, o livro divide-se em três partes. Na segunda e na terceira partes, uma série de vinhetas compõe um mosaico sobre a fugacidade da vida e a fragilidade dos afetos.

Em junho de 2021, Boris teve um AVC, mas sua recuperação foi considerada satisfatória. Sobre a morte, Boris costumava reproduzir uma citação de Elias Canetti, romancista e ensaísta de nacionalidade búlgara e britânica.

“Eu odeio a morte. Vou lutar até o fim contra ela, embora eu saiba que vou perder”.

Biografia

Filho de imigrantes judeus, Boris Fausto nasceu em São Paulo, no dia 8 de dezembro de 1930. Primeiramente, formou-se bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo, em 1953. Depois, em 1966, gradou-se em História pela mesma faculdade, onde se tornou doutor em 1969. Foi professor no Departamento de Ciência Política da USP e colunista semanal do jornal "Folha de São Paulo". Também integrou a Academia Brasileira de Ciências.

Texto e imagem reproduzidos do site: g1 globo com/sao-paulo