Socorro, não consigo mais ler livros.
Por Wagner Brenner.
Não consigo mais ler livros.
Não que eu não queira. Simplesmente não consigo.
Sou um leitor, desde que me entendo por gente.
Sempre li muito. E continuo lendo.
Mas de uns anos para cá, me alimentar compulsivamente de
internet tem causado um efeito colateral que ainda não consigo explicar muito
bem.
Só sei que agora, toda vez que pego um livro nas mãos, não
consigo ler, canso rápido. Se o texto não “embala” logo, preciso de muito
esforço para continuar com a leitura.
E não é só com o livro de papel. A mesma coisa acontece com
o livro digital. Não tem nada a ver com o tipo de apoio.
Tem a ver com a extensão do texto.
Essa situção tem me deixado agustiado.
Será que desaprendi a ler? Será que fiquei preguiçoso?
Será que agora só consigo ler coisas curtinhas e, de
preferência, com uns links?
Acho que não.
Na verdade, nunca li tanto como agora. Passo o dia inteiro
lendo. Mas leio cacos, fragmentos.
Sim, o efeito é conhecido e foi previsto anos atrás.
Sai o disco, entra a música.
Sai o filme, entra a série.
Sai a série, entra o curta do Youtube.
Sai a mesa de bar, entra o Facebook.
Sai o livro, entra o post, o artigo.
Tudo o que era consumido em pacote-família, em tabletão,
agora é consumido em formato M&M’s.
A gente já sabia que isso acontecer, faz tempo. Mas o que eu
ainda não tinha sentido na pele é que esse fenômeno do snack culture iria me
TIRAR algo e me IMPEDIR de ler textos longos. Porque uma coisa é você perceber
que existe uma nova maneira de ler (circular e não linear) e passar a usá-la.
Outra coisa é você perder sua capacidade de concentração.
Eu queria adicionar o jeito novo, mas não queria perder o
jeito velho.
A internet causou em mim (e talvez em você) um déficit de
atenção, um transtorno que consta da classificação internacional de doenças e
que requer acompanhamento médico (não que eu tenha procurado um, pelo menos não
por enquanto).
Já tentei de tudo, busquei aquelas ficções bacanas, cheias
de escapismo, com viagens para lugares distantes, coisas que eu devorava
durante a adolescência…mas 10 minutos depois o que escapa é minha atenção mesmo.
Fico voltando para o começo do parágrafo, sabe? Nem a
biografia do Steve Jobs eu consegui terminar.
Fico repetindo para o autor “vai, já entendi, conta logo,
pára de enrolar”.
Esse é outro sintoma: fiquei mais factual e perco fácil a
paciência com aquela fase de contextualização e envolvimento com os
personagens.
Meu kindle tem, neste exato momento, a ridícula marca de 18
livros iniciados.
Estou fazendo com eles a mesma coisa que faço com as músicas
no meu iPhone, que fatalmente acabam tomando uma “skipada” depois de alguns
segundos (tirando as do Zappa, que felizmente ainda ouço cada nota com prazer
até o fim). Pô, eu ouvia aqueles álbuns inteiros do Pink Floyd… agora isso
seria inimaginável.
Sei que isso tudo soa como algo ruim, mas nem isso eu tenho
certeza.
A civilização humana já passou por isso muito antes da
internet, por exemplo quando passamos da comunicação exclusivamente oral e acrescentamos
a escrita. Colocar conteúdo por escrito livrou nossa memória e permitiu textos
bem mais longos e precisos. Agora estamos de volta aos conteúdos curtos, mas
ainda mais precisos. E, se um dia desenvolvermos a telepatia, certamente as
palavras vão nos parecer ineficientes demais. Formas diferentes de trocar
conteúdos, histórias.
Enfim, um post pouco conclusivo, mais desabafo mesmo, para
ver se tem mais gente nesse barco.
Estou assustado por não conseguir mais ler um livro inteiro.
Fotos e texto reproduzidos do site: updateordie.com
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