Publicado originalmente no site Huffpostbrasil, em 22/05/2015.
10 dicas de leitura essenciais para amar os livros
Por Aina Cruz Redatora (tradutora, roteirista e blogueira).
Quem gosta de ler sabe que não há melhor companhia nessa
vida que um bom livro. Sempre que leio grandes autores fico emocionada e me
corrói uma pontinha de inveja da destreza que eles apresentam para transformar
tudo que em nós, humanos, é latente em tanta arte, essa força motriz que tudo
move e transforma. A literatura nos edifica a cada linha.
Certa vez, quando empreendi com meus alunos do ensino
fundamental a tarefa de ler uma adaptação do romance Notre Dame de Paris
decidi, antes de iniciar a leitura, executar uma enquete a respeito da leitura.
Perguntei a eles se gostavam de ler.
Para minha surpresa, a maior parte deles disse que sim, mas
alguns não gostavam muito das leituras propostas pela escola. Atribuí esse dado
à questão da obrigatoriedade, que termina por encher as coisas mesmo de uma
certa chateação.
Então, quis saber deles o porquê do gosto pela leitura. As
respostas foram variadas e, de maneira geral, bastante interessantes. Porém,
uma entre elas me chamou mais a atenção: "porque existem histórias,
professora, que mudam a nossa vida".
Ainda lembro-me do impacto que a frase me causou, pois, de
maneira simples e efetiva, aquela aluna acabava de me contar a razão pela qual
também eu era tão apaixonada pelos livros.
Na época, eu era professora de francês em uma escola de
ensino fundamental que tinha essa língua como obrigatória, assim, tínhamos
semanalmente aulas de gramática e de literatura.
Recordo-me que essa resposta me fez rever toda a metodologia
que eu utilizava para trabalhar a literatura francesa com meus alunos, pois,
naquele momento resolvi dizer adeus a todas as regras e obrigatoriedades chatas
de aquisição de vocabulário e estruturas linguísticas, para dedicar-me
completamente ao deleite daquela linda história com a qual Victor Hugo nos
havia presenteado.
Cada dia mais ciente do poder transformador da literatura,
decidi fazer uma lista de dez livros que considero essenciais. Não os elenquei
aqui do melhor para o menos bom. Isso seria impossível.
A ordem é aleatória e só o que posso dizer é que lamento não
ter mais mulheres presentes nesse post, fato que reflete, mais uma vez, a nossa
estrutura patriarcal que impede as grandes autoras de figurarem na mesma
proporção que os homens no cânone literário.
Com as devidas e necessárias observações já pontuadas,
passemos às obras:
1. Os
Dragões Não Conhecem o Paraíso, de Caio Fernando Abreu - Um conto mais intenso
e inenarrável que o outro. Caio mergulha no âmago da nossa alma e o conto que
dá título ao livro é uma das coisas mais lindas que já foram escritas,
certamente. A transitoriedade, a vulnerabilidade humana, está tudo ali, nas
linhas e em suas entrelinhas. Desde que o li, todos os dias, quando acordo,
entoa feito mantra: "que seja doce".
2. Primeiras
Estórias, de Guimarães Rosa - Não são histórias, são estórias e, sim, isso faz
toda a diferença. Guimarães nos coloca defronte ao imponderável do humano, mas
com toda a condição de redenção. Os personagens vão do terreno ao céu, eles
ascendem e transcendem suas dificuldades e apequenamentos. Desse tipo de beleza
que salva, assim é Substância e A Menina de Lá.
3. Júbilo,
Memória, Noviciado da Paixão, de Hilda Hilst - Esse livro, mais do que qualquer
outra coisa que eu possa ter lido em minha vida, ensinou-me o que é estar
apaixonada, o que é ser amante de alguém. O eu-lírico descreve suas dúvidas,
anseios, incertezas de uma forma tão entregue, exatamente como sempre fui, sou
e serei diante de meus enamoramentos seja por algo ou alguém. Certa feita,
recitei o poema de abertura do livro para um paquera na balada. Tínhamos 17
anos. Ele não entendeu. Correu de mim. Graças a Deus, pois de brutos assim o
inferno anda cheio.
4. A Teus
pés, de Ana Cristina César - A poesia de A.C.C me diz tanto que não consigo
discorrer sobre, sinceramente. Acho que me movimenta em lugares que eu sequer
compreendo, mas amo como ela é livre, como ela dói e como ela nos deixa espaços
e vazios que devemos decifrar e tentar preencher com nós mesmos.
5. O
Estrangeiro, de Albert Camus - O protagonista desse romance, o Sr. Meurseault,
primeiro nos revolta com sua falta de habilidade social e depois nos comove.
Sua existência é uma catarse coletiva, é o mundo afirmando que seremos
julgados, é a teoria do absurdo na veia. É entender-se humano, limitado dentro
de lógicas ilógicas.
6. América
ou O Desaparecido, de Kafka - Cheio de situações kafkianas. Não há como definir
sem essa redundância. Até onde escolhas feitas ao acaso podem nos levar? O
livro ficou interminado pelo autor, que faleceu antes de concluí-lo.
7. O Capitão
Saiu Para o Almoço e Os Marujos Tomaram Conta do Navio, de Charles Bukowiski -
Trata-se do diário dos últimos anos de vida do autor. Mas não espere melancolia
de quem está saudoso da existência. Não. Você só vai encontrar a verdade nua e
crua sobre a vida, o mundo e as pessoas que nele vivem. Vai aprender que passar
por aqui é bom, se tiver um hobby e uma garrafa de uísque por noite.
8. A Legião
Estrangeira, de Clarice Lispector - E dos escombros, nasce o humano. Seus
desejos, suas paixões. Ciúme, inveja, raiva, medo. Está tudo lá, daquele jeito
que a gente passa o tempo tentando negar que sente, mas toda pessoa existente
sobre a face da Terra se reconhece em cada um desse contos.
9. Paris É
Uma Festa, de Ernest Hemingway - Indico sobretudo para quem sonha de viver de
literatura. Para os amigos cheios de talento e ainda sem nenhum reconhecimento.
Trata-se do relato do autor da época que decidiu tornar-se escritor, mudando-se
para Paris e de sua batalha para escrever algo que o torna-se renomado.
Contudo, ele conta com a ajuda de autores célebres como Ezra Pound, com quem
discute longamente sobre o "fazer literário". A obra inspirou o filme
Meia Noite em Paris e, acredito, apenas isso já valha alguma atenção.
10. Anna
Karenina, de Liev Tolstói - Mais do que uma bela história de adultério e amor,
a narrativa russa nos confronta com a construção patriarcal, com o lugar
delegado às mulheres no século XIX e nos faz refletir o quão pouco isso tudo
foi modificado e o quanto mulheres ousadas são, desde sempre, ridicularizadas e
excluídas da "ordem" social.
E você, quais livros indicaria? Quais estórias
ou histórias são fundadoras do seu eu.
Texto e imagem reproduzidos do site: huffpostbrasil.com/aina-cruz
Nenhum comentário:
Postar um comentário