Sérgio Herz, presidente da Livraria Cultura:
crise leva
empresa a pedir de recuperação Judicial
Leandro Fonseca/EXAME
Publicado originalmente no site da revista EXAME, em 25 out 2018
Crise na Cultura escancara apocalipse das livrarias no
Brasil
Com pagamentos atrasados e forte concorrência da Amazon, a
Livraria Cultura vai ter dificuldades em se reerguer.
Por Mariana Desidério
São Paulo – A Livraria Cultura entrou ontem com pedido de
recuperação judicial, escancarando o momento de penúria do mercado de livrarias
no Brasil. Em entrevista a EXAME publicada no início da semana, o presidente da
companhia, Sérgio Herz, afirmou que o setor encolheu 40% na crise econômica, o
que levou ao fechamento de lojas e a atrasos nos pagamentos.
Editoras e funcionários demitidos estão sem receber. Se a
recuperação judicial se concretizar, terão de esperar ainda mais. No ano
passado, a Cultura recebeu 130 milhões de reais para assumir a operação
brasileira da rede de livrarias francesa Fnac. Chegaram a ser divulgados planos
para o fortalecimento da marca sob o guarda-chuva da Cultura, mas a decisão
final foi encerrar todas as lojas da francesa no país – a última, em Goiânia,
foi fechada este mês. Funcionários da Fnac demitidos fizeram um protesto pois
não receberam verba rescisória após o encerramento das lojas.
Outra grande rede de livrarias, a Saraiva passa por
problemas semelhantes. Editoras reclamam de atrasos nos pagamentos enquanto a
companhia acumula perdas. No segundo trimestre, a Saraiva reportou prejuízo de
37,6 milhões de reais, com um saldo devedor de 296 milhões de reais, valor que
a Saraiva levaria 12 anos para pagar se mantivesse um fluxo de caixa constante
sem novos empréstimos. A Livraria Cultura tem capital fechado e há algum tempo
não abre seus dados de balanço.
Efeito Amazon
Além do momento delicado para a economia do país, a situação
das livrarias se agrava com as transformações do mercado em escala global. E
essas transformações podem ser resumidas em um nome: Amazon. A gigante
norte-americana do varejo é conhecida por abalar os setores em que atua. Nos
Estados Unidos, a força da Amazon e das compras pela internet já iniciou um
processo batizado de apocalipse do varejo.
Por lá, enquanto os consumidores optam por comprar no
conforto de casa, shopping centers e redes antes consolidadas fecham as portas.
Alguns exemplos são a rede de brinquedos Toys R Us que decidiu encerrar as
atividades no país, e a rede de lojas de departamentos Sears, que chegou a ser
a maior do mundo nos anos 1960 e recentemente recorreu à lei de falências dos
Estados Unidos para tentar um suspiro final (a rede tem uma dívida de 5,6
bilhões de dólares).
A Amazon chegou ao Brasil há seis anos, vendendo apenas
livros. Na época, livrarias se mobilizaram e procuraram ajuda do governo para
limitar a atuação da varejista, alegando risco para o mercado. Levantou-se a
possibilidade de criação de um preço único do livro, para impedir que a
multinacional vendesse mais barato que suas concorrentes. Uma regra semelhante
existe em países como França, Alemanha, Espanha e Argentina. Um projeto que
tramita no Congresso (PL 49/2015) define que qualquer livraria, física ou
virtual, só pode dar descontos de até 10% para publicações no primeiro ano após
seu lançamento. Limitar descontos em livros num país com pouco hábito de
leitura é um tanto contraditório e o tema divide o setor. Enquanto isso, as
promoções e facilidades oferecidas pela Amazon atraem os consumidores brasileiros.
Mas é simplista achar que a derrocada da Livraria Cultura é
culpa da Amazon. O fato é que a companhia demorou para investir em tecnologia,
e há algum tempo vinha tomando decisões controversas. Uma delas foi vender
espaços de destaque em suas lojas para ações de marketing das editoras. A
prática pode até ajudar a pagar as contas no curto prazo, mas é criticada por
parte do mercado por reduzir a relevância da livraria para o seu maior ativo: o
leitor disposto a comprar.
Na entrevista a EXAME publicada essa semana, Sérgio Herz
afirmou que algumas das apostas da companhia para sair da crise são investir no
online e transformar suas lojas em locais voltados a experiências, com teatros,
restaurantes e eventos. A rede tem hoje 15 lojas no país. O pedido de recuperação
judicial mostra que a estratégia ainda não deu os resultados necessários para
levantar para a empresa. Se a recuperação for aprovada pela Justiça, a Livraria
Cultura ganha uma sobrevida, mas dificilmente sairá do buraco se mantiver
práticas ultrapassadas num mercado em rápida transformação.
Texto e imagem reproduzidos do site: exame.abril.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário